O que acontece depois de ficar dois anos sem beber?
A primeira Coluna da Jana está no ar.
Por: Jana Rosa
No dia em que eu decidi parar de beber por um mês, eu tinha acordado no chão do banheiro da minha casa sem saber o que tinha acontecido na noite anterior. Era o auge da pandemia e eu tava em completo isolamento e desequilíbrio emocional, porque sentia muito medo, muita tristeza do que tava acontecendo e muito ódio do governo. Aquele combo que tanta gente sentia.
Era aquela fase em que nada abria, só o supermercado, e a gente mal saía na rua. Que loucura lembrar que dois anos atrás vivemos assim por muito tempo (pelo menos uma parte de nós), e eu tava lá, completamente isolada e enchendo a cara todas as noites pra ligar pros meus amigos e ter uns momentos de alegria, ou o que parecia ser alegria.
Só que quando acordei no chão daquele banheiro e me olhei no espelho, eu vi uma pessoa muito decadente, e percebi que, com aquele buraco que eu sentia dentro de mim, ou realmente parava de beber por um tempo ou ia dar merda. Aí eu parei, e não digo que foi fácil, porque antes disso eu já tinha ficado uma vida inteira dizendo “eu preciso parar de beber”, só que bebendo tudo de novo na semana seguinte, meio que igual todo mundo fala depois de uma grande ressaca. Eu até achava que meu estado natural era ressaca, e já chegava falando pras pessoas que o meu normal era estar de ressaca.
Também tinha uma estratégia naquele momento da pandemia que era sentir o mínimo de altos e baixos possíveis, pra tentar ficar lúcida no meio do caos, e eu achava que sem bebida conseguiria, já que quando chegava a noite ficava eufórica e quando acordava sentia uma tristeza profunda causada pelo ressacão, que era cada dia pior.
Talvez eu me arrependa de escrever um texto tão pessoal, porque odeio a opinião que as pessoas têm sobre mim na internet, mas olha que interessante, essa opinião me incomoda porque são pessoas que nem me conhecem falando que eu sou uma doida, que tá sempre bêbada e chorando. Digo isso porque abri uma caixinha no meu Instagram essa semana e só recebi esse tipo de mensagem, o que me deixou muito puta e decepcionada. Mas será que não era exatamente essa imagem que eu passava pras pessoas nas redes sociais (e na vida real) antes? Como essa coluna é sobre bem-estar — e a minha história pela busca pra me sentir bem começou nesse dia, no chão do banheiro — vou ter que encarar os meus demônios. Depois de adiar essa newsletter por 4 meses, chegou a hora de ela nascer.
*Aliás, tenho que dizer que o que me fez finalmente ter essa coragem foi um email que recebi encaminhado pela Marcela Ceribelli, de uma newsletter que ela assina, feita por uma escritora que estava compartilhando a sua decisão de parar de beber. A Marcela lembrou dessa minha mudança de hábito e me mandou o email, e acabou me mostrando que é possível falar sobre esse assunto na internet de um jeito leve.
Acho que nem preciso dizer que essa é a minha experiência e não sou especialista, mas desde que decidi parar de beber tive o suporte de vários profissionais, de psiquiatra a astrólogo (afinal queria fazer tudo certinho e de acordo com os astros), que me avisavam há anos que eu não estava nada bem.
Me dava muito medo falar sobre isso na internet, porque quando você fala que parou de beber, as pessoas tentam te oferecer uma bebida pra você voltar, em seguida te oferecem droga pra te ajudar a não ter que ficar sóbria, e se você fala que não quer nada mesmo (que é o meu caso), é aí que te olham como se você tivesse um super problema, quase constrangidas ou com vontade de sair correndo de perto de você. Sempre questionei se deveria falar sobre isso, já que nunca cheguei a ser diagnosticada como alcoolista, e nem tenho como falar sobre o assunto, mas lendo um livro chamado “Sober Curious”, que descobri nessa newsletter que a Marcela me mandou, encontrei uma definição muito boa da autora.
Ela fala que as pessoas colocam a bebida num 8 ou 80, ou ela é muito divertida e necessária pra todo mundo ser feliz, ou você é dependente e tem que parar, mas a real é que no meio desse espectro ela pode simplesmente te fazer mal pra caralho e afetar muito a sua vida. E o mais chocante, que ela também fala no livro, é que às vezes você só percebe o quanto a bebida te faz mal quando você tira totalmente e conhece a sua vida sem ela. E a vida sóbria é difícil de enfrentar, imagina então em uma pandemia com a família Bozo azucrinando, mas eu juro pra você que é animal, porque é aí que você conhece a verdadeira você, em TODAS as situações.
Depois de dois anos que tomei essa decisão, finalmente entendi o que aconteceu quando parei de beber: conheci uma versão minha que eu não sabia que existia. E a real é que eu gostei muito mais dessa versão, acho que só aprendi a gostar de mim de verdade depois de ficar sóbria. Mesmo quando eu tenho um dia difícil, tipo hoje, gripada, cheia de problemas, achando que fodeu as tretas do trabalho, consigo entender que é só mais um dia e amanhã pode ser que melhore, mas eu tô aqui inteira, sem precisar encher a cara pra esquecer e acordar me sentindo uma merda depois. Isso pra mim já é muita coisa.
Não gosto que as pessoas achem que quem não bebe (porque hoje sou referência de amiga sóbria entre meus amigos, desculpaê) é uma pessoa chata que quer que todo mundo pare. Eu acho que cada um tem que fazer o que bem entender. Nada me tirava mais do sério do que receber esse toque de alguém, mas lá no fundo, apesar das piadas com ressaca e com a vidaloka, eu já sabia que a bebida me fazia muito mal, e tinha medo de admitir que deveria cortar ela, porque isso significava virar uma pessoa chata, sem assunto e que não sai de casa.
Já saí tanto de casa depois dessa terceira dose que tive que fazer promessa pra ser caseira, e nunca me diverti tanto como nos últimos tempos, porque as pessoas sóbrias realmente aproveitam a festa, elas ouvem todas as músicas, veem todos os bafões e lembram das conversas mais loucas pra comentar no café da manhã, afinal quem não bebe vai embora mais cedo e aproveita o dia seguinte. Eu nem sabia que acontecia o dia seguinte!
Só que isso é um papo pra uma outra coluna, se a curiosidade pela sobriedade fizer sucesso. Essa minha estreia com dicas de bem-estar de uma pessoa caótica é só pra dizer que no fundo a gente sempre — ou quase sempre — sabe o que tá nos fazendo muito mal, e chega uma hora em que a gente finalmente consegue enxergar que tá na merda SIM. Dá pra perceber. Aquela imagem decadente no espelho não era nenhuma novidade pra mim, eu acordava assim quase todos os dias, só que aquela manhã foi tão fundo do poço que eu tive que reagir. Sei que é quase um superpoder conseguir cortar um hábito que tá te destruindo, mas às vezes você precisa desse toque, eu precisava.
Posso contar mais sobre a vida sóbria e tudo o que muda com ela, como o humor, o equilíbrio emocional, seu corpo, suas relações, sua pele e até a sua cara — o antes e depois é chocante. Acho que essa newsletter de sexta-feira vai funcionar mais como uma carta aberta e vai precisar de interação, então gostaria de saber a sua opinião pra criar as próximas. Também vai ser uma maneira de encontrar uma nova turma na internet, já que muitas pessoas que me acompanham desde os 20 anos (pode acreditar que faz quase 17 anos que tô aqui?) só me viam muito doida e bêbada falando absurdos, o que hoje acho um pouco fofo, porque aquela maluca odiaria me conhecer sóbria e com uma rotina saudável.
O que ela tem a ver com skincare pra estar na Bonita de Pele? Digamos que quando você se sente melhor, sua pele melhora, e não vamos esquecer que wellness já foi o novo skincare, que hoje é o sexualcare, ou já mudou pra algo mais gen Z? E eu sou a criadora da Bonita de Pele, então é mais do que justo que eu ganhe uma coluna aqui nessa comunidade que fundei.
Te vejo na semana que vem, me escreve nos comentários, email (jana@bonitadepele.com.br) ou no nosso grupo de Telegram pra sugerir temas e comentar o que achou.
bjs,
Jana Rosa
@janarosa
Amei a newsletter. ontem, fazendo um curso, deram a definição que newsletter deve ser metade news e a outra metade letter, como uma carta aberta. Parabéns por compartilhar com a gente. Eu não parei de beber, mas diminuí horrores! E tenho me sentido bem melhor! E o dia seguinte, sem ressaca, é lindo e uma delícia de ser aproveitado <3
Amei ler seu ponto de vista, Jana! Nunca gostei de beber, porque acho o sabor horrível, e aí de quebra economizo quando saio kkk e sim, posso dizer que me divirto muito!! A gente realmente presta muito mais atenção no que acontece ao redor, acorda ótima e até pronta pra outra. Queria que mais gente pensasse que dá pra viver assim e parasse de oferecer também, ou de achar a gente louca kkk quem quer bebe, quem não quer, não precisa beber ué hahaha